quarta-feira, 14 de julho de 2010

A Noite Interminável

Parte II

O homem chama-se João Doni, têm uns 45 anos e é solteiro. Representa uma pequena indústria paulista que fabrica roupas para a população de baixa renda. Veio ao município para demonstrar as vestimentas aos pequenos comerciantes da região e talvez com sorte, sair com novos negócios realizados. Sua mala está abarrotada de amostras: camisas, blusas, meias, calças e agasalhos, vários catálogos e listas de preços, além de suas próprias mudas de roupas.

João procura um banco no local mais iluminado possível, como sugeriu o dono do bar. Coloca a mala e a valise debaixo dele e acomoda a almofada às suas costas. Começa a folhear o jornal. São vinte três horas e trinta e um minutos. É difícil ler, pois a luz do poste é fraca.
Após meia hora, já não há mais jeito confortável e ele está sentado sob a almofada, pois o estrado de madeira do banco é cruel. O jornal deixou de lhe interessar e o relógio é consultado a todo instante. O tempo custa a passar. Ao menos a temperatura está agradável agora e sopra uma brisa leve, pois o dia foi de muito calor.
A viagem foi exaustiva. A saída de São Paulo foi às dez horas e naquela hora da manhã já estava muito quente. O motorista do ônibus regulou durante todo o itinerário a temperatura do ar condicionado, pois nem todos os passageiros suportam o frio e costumam reclamar. Não é o caso dele, que está com sobrepeso e costuma suar muito, mais ainda de traje completo e gravata. Faz muito tempo que ele deixou de gostar de viajar para o interior. Rodovias, estradas, retas, curvas, pastos, plantações, bovinos, garças, vilarejos e cidadezinhas. Ficou monótono ver e rever tudo isso centenas de vezes em dezenas de anos.
João torna a olhar o relógio. São dez minutos. Dois sentimentos o invadem: medo e esperança. Ter que passar o resto da noite naquela praça lhe provoca arrepios e ao mesmo tempo alívio, uma vez que mantém o pensamento de que falta pouco para o amanhecer. Seu corpo está cansado demais, mas seus sentidos ainda estão muito ligados pelo instinto de defesa. Ele olha a sua volta as árvores negras, os canteiros negros e os caminhos negros e todo o resto, em tons mais ou menos escuros. Ao longe um cachorro late e outro responde em seguida, quebrando o silêncio. A almofada virou travesseiro e ele estende seu corpo ao longo do banco. Apesar de sua altura apenas mediana, seus pés ficam para fora. É bem desconfortável. Se ao menos houvesse estrelas, ele as contaria, assim como quem conta carneirinhos para tentar dormir. Porém, só há a escuridão. Novamente consulta o relógio e desolado, constata que só passaram mais cinco minutos desde a última verificação. Puxa um lenço do bolso e o coloca sobre o rosto, pois a luz ofusca diretamente seus olhos.
Finalmente vencido pela estafa, adormece.
(continua...)


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