quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A Noite Interminável

Parte IX

Apesar de não ver mal algum em contar ao idoso, João nunca se sente confortável em relatar fatos de sua vida privada à outras pessoas. Nem tanto por não ter em quem confiar, mas por achá-la desinteressante e sem importância. Sempre que pode, foge do assunto. Agora desvia, fazendo mais perguntas à Manoel:

- E a sua família, sua mãe e irmã? o senhor casou, teve filhos?

- Mamãe morreu em 1996 aos oitenta anos. Teve um derrame e ficou inválida por seis meses. Foi um período muito difícil para nós. Cuidar do negócio e da mãe doente exigiu-nos uma força de vontade extraordinária. Minha irmã, sete anos mais jovem do que eu, desistiu do sonho de ser dentista e formou-se nutricionista. Ninguém forçou sua decisão, mas acho que ela acabou pegando gosto pela coisa de restaurante e isso veio a calhar. Deixei o restaurante prá ela tocar e além disso, trabalha em seu próprio consultório particular. Está indo muito bem! Quanto a mim casei-me maduro, aos trinta e oito anos, com uma paulista daqui da cidade chamada Maria Aparecida. Ela era muito jovem e bonita, vinte e dois anos, por isso levei muito tempo para convencer seus pais da minha seriedade de propósitos. Por fim aceitaram, mas a população inteira comentou durante anos a diferença de idade, a situação do casamento, até que todos cansaram ao ver que estava dando certo. Cidade pequena é assim mesmo, né? Após um ano de união, tivemos uma filha, Joana. Ficou nisso a família, Deus não nos permitiu outra graça!

- E você, que ainda aparenta jovialidade, por que não se casou?, devolve Manoel.

- Acho que não apareceu a pessoa certa. Quando eu era adolescente namorei várias meninas, sem muito compromisso. Depois de adulto, tive outras aventuras sem significado. De repente, parei de procurar. Sempre fui envolvido demais com o trabalho e ainda por cima tenho a minha mãe para cuidar até hoje, responde João com certo desânimo.

O velho interrompe com ar filosófico: - Nunca é tarde para amar. Ainda é tempo de ser feliz, meu filho! Veja o meu caso. Eu era só um pouco mais moço que você quando casei e deu tudo certo. Fui pai com quase quarenta anos.

- Acho que não vai dar mais, reforça João, fazendo uma longa pausa na tentativa de encerrar a conversa. Espreguiça-se demoradamente no banco e depois põe-se de pé. Sem falar mais nada, passa a caminhar em volta da praça. Agora já está mais claro e ela vai tomando cores. Os gramados no seu entorno estão molhados de orvalho. Dá prá ver os canteiros floridos, bem cuidados e as àrvores têm plaquinhas com seus nomes escritos. O colorido dos brinquedos se distingue em meio ao areal. João anda até o coreto, que é redondo e tem duas entradas opostas com dois degraus em cada uma delas. Ele sobe e dali, contempla o centro da cidade ao seu redor. São cinco e meia da manhã.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Fazer o bem sem olhar a quem é a virtude desprovida da bondade.
(Centurião)

sábado, 23 de outubro de 2010

A herança dos valores


Outro dia estávamos eu e minha mulher sentados à mesa do jantar, lembrando sobre os trinta dias da morte da minha sogra. Muito emocionada, ela contou-me uma passagem de sua infância, quando tinha uns dez anos de idade, por ai.

No Natal daquele ano, sua mãe lhe presenteou com uma boneca - muito pequena, cujo tamanho talvez não alcançasse nem dez centímetros, mas com longos cabelos que iam até quase os seus pés – e teria comentado algo assim: - Esse ano o Papai Noel só pode te trazer uma destas! E lá se foi minha mulher, toda feliz com sua bonequinha sem grife, cuja longa cabeleira era penteada a todo instante, companheira inseparável debaixo do travesseiro nas noites de sono e de sonhos infantis. É bem provável que naquele instante ela nem tenha se dado conta sobre o ensinamento que estava recebendo, só importando que o valor intrínseco de sua nova amiguinha era igual a de uma Suzi, boneca mais cobiçada pelas meninas daquela época.

Mais de Quarenta anos depois, essa história, contada por ela com lágrimas nos olhos é a prova mais espetacular da herança deixada pela sua mãe, a de valorizar a vida como ela se apresenta a cada momento. Hoje ela sabe que naquela pequena boneca estavam contidos os enormes valores do amor incondicional, do sacrifício material e da serena felicidade em fazer uma filha feliz. E eu, também com os olhos marejados, fiquei com mais certeza ainda da perpetuação desses e de outros valores fundamentais à vida de nossos descendentes.

sábado, 16 de outubro de 2010

A Noite Interminável


Parte VIII

Manoel limpa a garganta, depois de um longo suspiro: - Infelizmente meu filho, o dinheiro não têm alma! As fábricas foram deixando a cidade. Uma soma de fatores levaram os calçadistas à estabelecer-se em Franca. Políticos inoperantes, Guerra fiscal pelas empresas entre os municípios, adoção do modelo exportador de calçados pelo governo federal, menor distância até o porto de Santos, mão-de-obra mais qualificada e fácil de captar e maior população foram determinantes. No início dos anos oitenta só duas indústrias permaneceram. O contingente de trabalhadores caiu para mil e quinhentos e hoje, não chega à mil em ambas. Podes imaginar como a cidade decaiu depois disso? Foi uma tristeza só.

- Posso apenas ter uma vaga idéia do desastre que deve ter sido. Só quem sente na própria carne um infortúnio como esse pode realmente saber como é, responde João, em tom solidário.

- Tive que me adaptar para sobreviver, rebate o velho. Encolhi o negócio: mudei para um local com metade da área anterior, demiti empregados, me desfiz de bens particulares, terrenos, automóvel, casa na praia. Fui morar numa casa modesta e por aí foi por uns cinco anos, até que pude estabilizar a vida novamente. Voltar a estaca zero, como se diz! Mas isso já faz muito tempo. São àguas passadas!

João olha para Manoel sem dizer nada. Permanece calado por um longo tempo, como que digerindo a narração da história. Consulta o relógio novamente. São quatro e meia. Apesar de ainda estar escuro, o dia já ameaça despontar. O cantar precoce de um galo o anuncia.

Depois de minutos que parecem horas, o idoso quebra o silêncio: - E você filho, como foi parar na indústria de confecções?

- Depois que deixei a empresa de consórcios, já tinha alguma experiência com vendas. Certo dia ao folhear as páginas dos classificados de um jornal, respondi ao anúncio de promotor de vendas de roupas. Não foi muito difícil conseguir a vaga e depois de vinte anos na empresa, promovido para vendedor e depois para supervisor, cá estou hoje! Minha vida têm sido rodar pelo interior do Estado com uma equipe de oito vendedores, cada um com um roteiro diferente.

- Você pretende ficar quanto tempo aqui?, indaga de novo Manoel. E prá onde vai depois?

João olha prá cima, cruza os braços e fica um bom tempo contemplando o céu, antes de responder. Depois, torna a olhar para o velho e fala:

- Estranho sabe, não tenho rumo certo dessa vez. Amanhã, antes de ir embora, terei que telefonar para a fábrica para confirmar o próximo lugar. Talvez até me mandem voltar para casa!

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

ESPETACULAR!


Quem salva uma vida, salva o mundo inteiro.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Renúncia

Diálogo entre um estudante e o mestre Bhaduri Mahasaya:



- Mestre, o senhor é maravilhoso! Renunciou às riquezas e ao conforto para buscar Deus e nos ensinar a sabedoria!
- Você está invertendo as coisas! Deixei algumas rúpias desprezíveis, alguns prazeres mesquinhos, em troca de um império cósmico de bem-aventurança interminável. Como dizem, então, que neguei tudo a mim mesmo? Conheço a alegria de partilhar o tesouro. Chamam a isto sacrifício? As multidões míopes do mundo é que são as verdadeiras renuciantes! Renegaram a posse de um bem divino sem paralelo, por um mísero punhado de brinquedos terrestres!  

(Do livro Autobiografia de um Iogue, de Paramahansa Yogananda, Cap.7-pag.72)

Dica de leitura

Olá, Pessoal,
Dessa vez minha dica de leitura é " A Assustadora História da Medicina ", de Richard Gordon, Ediouro, um livro muito divertido, curioso e informativo. O autor conta a história da medicina através de seus principais personagens e até de pacientes famosos. Segundo ele, é uma longa substituição da ignorância pela falácia. Richard Gordon nunca fez a medicina parecer tão desajeitada e tão engraçada.